quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Semana Sitcoms Literárias: Capangas Contratados


Crimes! Ação! Violência! Tiros! Sacanagem da braba! E uma completa ausência do politicamente correto, graças a Deus (ou a Satã)! Essas são as palavras que melhor definem Capangas Contratados, a Sitcom Literária de Carlos Cyrino (vulgo eu).
           
Abusando do exagero intencional e batendo às portas do limite do trash, ela conta as loucas aventuras de três capangas contratados do braço da máfia chinesa em operação em São Paulo.
           
Tavares, o mais velho e mais experiente, é o mais centrado e mais inabalável em sua linha de trabalho pouco ortodoxa. Nada mais o choca, pois já viu de tudo, e por isso está sempre de cabeça fria. É o cara que você gostaria de ter ao seu lado quando o bicho pega.
           
Já Souza, quase tão experiente quanto Tavares, é o extremo oposto. Esquentado, psicótico e violento, é completamente alucinado e, por isso mesmo, é o cara que você gostaria de ter ao seu lado quando as balas começam a voar e a porrada a comer solta. Dono de um senso de humor todo peculiar, seu hobby favorito é dividir com os parceiros suas bizarras aventuras sexuais.
          
Completando o trio, Eduardo, mais conhecido como o Novato, que, como o próprio apelido diz, acaba de começar no novo “emprego”. Imaturo, inexperiente, mas ansioso por aprender, não deixa de cometer alguns erros de principiante que dificultam a vida. Alvo constante das sacanagens de Souza, encontra em Tavares uma figura paterna, ainda que este lhe demonstre amor através da rigidez.
           
Juntos, vão se meter em muitas confusões explosivas enquanto tentam ganhar a vida de maneira simples e humilde, fazendo os mais variados trabalhos, indo desde a extorsão até o assassinato, passando no caminho por intimidação, prostituição e tudo mais que se possa imaginar.
           
A série se utiliza do humor escrachado, exagerado ao extremo para fazer graça com assuntos que, de outra maneira, não teriam o menor humor. É como um filme de Quentin Tarantino sob o efeito de anfetamina. Ritmo acelerado, situações bizarras e humor negro que não deixam o leitor descansar um minuto sequer.
           
Não recomendada para os fracos de coração ou os que se ofendem com qualquer coisa, mas perfeita para aqueles com senso de humor pouco ortodoxo que acreditam que tudo é passível de virar piada.
           
Assim é o mundo de Capangas Contratados. Entre por sua conta e risco. Mas depois não diga que não foi avisado!

Estreia em 07/12 no site da Toró Na Cuca.

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Semana Sitcoms Literárias: Gosto de Remédio



Gente folgada e desocupada. Vizinhos e amigos sem noção e a completa falta de responsabilidade para e com qualquer coisa. Admita, você deve conhecer muita gente assim. E esses são apenas alguns dos elementos básicos de Gosto de Remédio, a Sitcom Literária de Jean Di Barros.
           
Demonstrando com muito humor e tiradas certeiras que não há nada na vida ruim o bastante que não possa ficar pior, o autor nos apresenta um grupo de amigos das antigas, empacados no tempo e no mesmo cotidiano rotineiro.
           
Rafael, o popular Vermelhinho (mas não o chame assim) mora sozinho num apartamento que na verdade é a garçonniere de seu pai. Dessa forma, quando o velho está a fim de dar umazinha, Vermelhinho transforma-se instantaneamente num sem teto até a manhã seguinte, quando, por obrigação contratual, ainda tem de limpar a bagunça da noite anterior.
          
Não bastasse isso, ainda tem de aguentar seu amigo e vizinho Chelo, possivelmente o sujeito mais sem noção do mundo, que adora assaltar a geladeira de Rafael e é incapaz de manter um segredo ou ter uma conversa séria. Casado e frequentemente expulso de casa pelos mais variados motivos, costuma buscar abrigo com seu chapa.
          
Os dois recebem as constantes visitas de Rico, um hippie paz e amor que descobriu a maconha em algum ponto de sua adolescência e desde então está travado no mesmo ponto. Bicão e inconveniente, é verdade, mas não seriam essas as bases de qualquer amizade?
          
A vida de Rafael começa a mudar quando descobre que sua ex, de quem ainda gosta, está namorando Febem, um completo imbecil, e bróder dos três amigos. Não bastasse o novo casal esfregar toda sua felicidade nas fuças de Vermelhino, pra completar ele ainda descobre que é pai de uma menina adolescente, fruto de um relacionamento com uma antiga namorada que não via há tempos, ou 14 anos, pra ser mais exato.
         
Agora, com uma responsabilidade recém descoberta, será que Rafael vai finalmente tomar juízo e fazer algo mais de sua vida que não beber e limpar a bagunça de seu pai?
           
Será que Chelo algum dia vai parar de atacar a geladeira do Vermelhinho?
          
Será que Rico vai se tocar que os hippies só eram legais nos anos 60?
           
Todas essas respostas às vezes amargas, outras doces, como um mal necessário para a melhora, você encontra em Gosto de Remédio.
 
Estreia em 05/12 no site da Toró Na Cuca.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Número ímpar


 
Chega uma hora em que você olha em volta e constata: todos ao seu redor formam pares. Dois pra cá, dois pra lá. Chegam em pares, cumprimentam em pares, sentam em pares, bebem em pares, conversam entre pares e eventualmente vão embora em pares. Aí você percebe outra coisa.

Dá-se conta que só você não faz parte de um par. Você, meu amigo, é um número ímpar. É o número um, o mais solitário de todos. Você é o motivo matemático para os números quebrados resultantes de qualquer operação simples. É um problema, pois todos sabem que é muito mais fácil dividir entre pares.

Depois que você percebe ser o elemento estranho da fração, instaura-se a paranoia. Pares e ímpares não se misturam. Não podem conviver juntos, são as regras. Não fosse assim, nada seria determinado através do “par ou ímpar”. Ou no “dois ou um”.

Dois mais um são três. Ímpar. Quatro mais um igual a cinco. Ímpar. Percebeu? Se tivesse mais alguém com você, ok, formaria mais um belo número redondo. Mas não, você é um ímpar e não se completa no meio.

A equação está fechada, não é aqui que você vai encontrar aquele outro um que falta para completar a dupla e suavizar a conta. O problema é que você não sabe onde estão os outros ímpares. Aliás, ímpares é exagero, você quer apenas um. Um número um solitário como você. Mas eles parecem em extinção. Talvez porque estejam constantemente formando pares. Já nascem querendo somar-se a outro.

Enquanto pensa nisso, olha para um lado e para o outro, e, sentindo-se cafona pelo trocadilho mental barato, pensa consigo mesmo: bem que eu queria ter um par. Ser um par. Ser um só não funciona mais. Até os computadores funcionam em código binário. Até um zero seria mais desejável que ser um. Zero à esquerda.

Mas não há nada a fazer nesse momento, então apenas suspira, toma um gole de cerveja e acende um cigarro em silêncio, torcendo para que ninguém mais naquela mesa perceba o invasor infiltrado. Um número ímpar em desarmonia. Aquele que insiste em não formar par.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Como ser um alternativo true

Nova matéria deste que vos escreve, publicada no Delfos. Artigo de cunho puramente humorístico (com algum fundo de verdade).

Leia aqui.

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Fahrenheit 451



Um mundo sem cultura, onde a televisão entorpece mentes, livros são proibidos e vistos como uma atividade anti-social e bombeiros não apagam incêndios, mas os causam para queimar as obras de literatura. Esse é o assustador mundo de Fahrenheit 451.

Baseado no livro do escritor americano de ficção científica Ray Bradbury e dirigido pelo francês François Truffaut, mestre da nouvelle vague, o filme mostra esse futuro não tão distante assim, pela ótica de Montag (Oskar Werner) um dos bombeiros responsáveis por encontrar e queimar os proibidos livros.
          
A princípio um fiel seguidor desta lei sem nexo, aos poucos a inevitável curiosidade humana o leva a querer saber o que dizem as obras que ele incinera diariamente, o que o fará questionar as regras da sociedade e se rebelar contra o status vigente.
          
A idéia da película é boa e já rendeu milhares de filmes similares posteriormente, com o conceito de um controle forte da sociedade a partir da supressão da cultura, nesse caso específico, representada pelos livros.
           
É interessante notar que a linguagem escrita não aparece nenhuma vez no cotidiano dos personagens (exceção feita quando algum deles lê um livro). Assim, só restam números e a imagem ganha uma importância absurda. Até mesmo o jornal que Montag lê constantemente é composto apenas por figuras.
          
Esse fato também caracteriza uma ferrenha crítica à televisão, retratada como o mais poderoso instrumento de controle, servindo como um “anestésico” e manipulador de informações, algo muito familiar à nossa sociedade atual. É até engraçado a contradição mostrada na obra, com os livros taxados de estimularem a anti-sociabilidade, para logo em seguida mostrar as pessoas em suas casas, sem contato ou diálogo, sentadas em frente à TV feito zumbis. Interessante notar também que já na década de 60 havia o conceito da TV interativa, algo que ainda engatinha atualmente.
          
No entanto, mesmo com essas duras e pesadas críticas, o filme escorrega em dois momentos. O primeiro, ao não explicar como numa sociedade que aparentemente aboliu toda e qualquer forma de linguagem escrita, as pessoas ainda sabem ler. Pode-se argumentar que a proibição aos livros é algo relativamente recente ou que apenas eles foram proibidos e o alfabeto ainda é ensinado. Mas para um melhor domínio da população, não seria mais eficaz suprimir a escrita e a leitura de vez?
           
Alguma referência sobre esse fato, ainda que mínima, com certeza não faria nenhum mal ao andamento da narrativa.
          
O outro momento é que, ao criticar a perda de personalidade causada pela falta de leitura e, portanto, do estímulo da imaginação, fazendo os indivíduos perderem sua identidade, ao mostrar o outro lado da moeda, acarreta-se o mesmo problema.
          
Ao final da película, Montag toma conhecimento da existência de uma pequena comunidade de pessoas amantes da literatura e ruma para lá. Ao chegar, descobre que as chamadas “pessoas-livro” fazem jus à sua designação. Elas não têm mais nome próprio, são conhecidas apenas como as obras que representam. E isso não é legal. Sem identidade, tanto faz se você é um zumbi da cidade ou Sonhos de Uma Noite de Verão, de Shakespeare, sua existência ainda é nula.
          
A idéia é bacana, e sem dúvida até surpreendente, ainda que se precise de uma enorme força de vontade para acreditar que um sujeito realmente consiga decorar um livro palavra por palavra e não se esquecer nunca de nenhuma passagem, mas nesse ponto a crítica saiu pela culatra.
          
No mais, é sempre um prazer constatar o total domínio de cena que Truffaut consegue imprimir (mesmo em um trabalho fora de suas características habituais), com movimentos de câmera precisos e ritmo narrativo na medida certa.
          
Já o estilo de atuação pouco realista e a direção de arte (incluindo figurinos) são elementos que envelheceram mal, ainda que não afetem em nada a apreciação do filme.
          
Fahrenheit 451 não é o melhor trabalho de Truffaut e nem mesmo uma das melhores ficções científicas do cinema, mas suas críticas e contradições ainda são válidas e necessárias, principalmente nos dias de hoje, quando muito do futuro retratado no filme parece já ter chegado para nós.