Chuck Palahniuk sempre será lembrado como o cara que escreveu Clube da Luta, o romance que deu origem ao filme cult de David Fincher com Brad Pitt, Edward Norton e Helena Bonham Carter. É ao mesmo tempo injusto – ficar preso eternamente a seu primeiro romance publicado – e, no entanto, faz todo sentido, afinal, foi o trabalho que apresentou todas as suas principais características, que seriam melhor ou pior desenvolvidas em seus trabalhos posteriores.
Palahniuk não é o tipo de escritor capaz de fazer um romance denso sobre a 2ª Guerra Mundial, saltar para uma comédia romântica leve e terminar num policial noir. Isso não é em si um defeito ou uma limitação. É uma característica. Ele é o tipo de artista que constrói seu universo particular e passa a desenvolver cada nuance dele em seus trabalhos seguintes. Cabe ao leitor desvendar seus códigos e entrar nele. É como um Stephen King se este não se limitasse ao terror e ao fantástico.
E seu mundo, em particular, é bastante esquisito. Bem parecido com o nosso, é verdade, se este estivesse sob o efeito de uma dose cavalar de energéticos e estimulantes. Palahniuk é um crítico da vida moderna, mas também gosta de antecipar algumas tendências. Como recurso para fazer isso acontecer, usa e abusa do exagero. Extrapola. O que torna algo tão urgente em seus trabalhos não é o choque que ele gosta de provocar e o faz tão bem. É a certeza de que situações x conforme mostradas por ele, no ritmo alucinante do mundo de hoje, podem estar a meros meses ou até menos de se concretizar.
Trata tudo em tom de farsa para dar uma certa leveza à leitura e aos assuntos muito sérios que aborda. Seja a falta de identidade do homem moderno, que se redescobre à base da porrada ou a homens decadentes que reavaliam seus erros passados enquanto esperam na fila para transar com uma atriz pornô, sempre há um misto do surreal com o assustadoramente real.
A decadência sempre está presente. O mundo que seus personagens habitam é cheio de doenças, empresas inescrupulosas, maus elementos, gente egoísta, azarada, acabada, à beira do precipício. Gente que ainda não pulou porque ou ainda espera encontrar algo melhor mais à frente ou porque não tem a presença de espírito de perceber que depois do fundo do poço só há lama.
Tempera tudo com extensas pesquisas. É um detalhista. Contribui para o dito exagero com repetições de termos e fórmulas do que quer que seja o tema da vez. Seja nas dicas de como fabricar bombas dadas por Tyler Durden ou nas bizarras (e reais) dicas de limpeza dadas pelo empregado doméstico protagonista de Sobrevivente. São os toques verídicos que complementam o teatro do absurdo de suas narrativas.
Seria depressivo se não fosse tão engraçado. Seu trabalho deve ser levado a sério, mas não tudo. Nunca ao pé da letra. Quem faz esse tipo de leitura deve pensar que o autor só se veste de preto e nunca sorri. Não é o caso. Tampouco ele é a personificação viva de Tyler Durden, não sai por aí explodindo prédios de empresas de cartões de crédito e questionando cada mínimo aspecto da vida moderna enquanto vai passear com o cachorro.
E olha que estaria mais que justificado se ele fosse assim de fato. Sua vida pessoal é cheia de histórias tão escabrosas quanto as que aparecem em sua ficção. Essa é sua válvula de escape. Suas neuras viram personagens, seus estresses se transformam em tramas e seu saco cheio com o mundo se traduz em romances bestsellers.
Quem ganha é o leitor, que solta o riso nervoso sabendo que não devia se divertir com coisa séria, mas o faz assim mesmo. Nada mal para um cara preso em seu mundinho particular.
Semana que vem, publicarei outra matéria, falando mais especificamente de cada um de seus livros. Fica o aviso.
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