segunda-feira, 21 de maio de 2012

Cortar o cabelo de peruca


Eis uma situação digna do mote “mais estranho que a ficção”. Semana passada fui cortar o cabelo, dar o popular “tapa no beloto”. Corto há anos no mesmo lugar, um desses barbeiros de bairro que já está estabelecido na região há décadas. Sua freguesia é composta principalmente pelo pessoal mais velho da vizinhança e prestadores de serviços próximos, como taxistas e por aí vai.

Mas a figura que encontrei já sentado na cadeira naquela manhã nunca havia visto lá antes. Tiozão, entre o final dos 50, começo dos 60, barriga proeminente, cara toda cheia de pintas e o cabelo já formando um mini-mullet. Sabe aqueles sujeitos que você encontra em qualquer lotérica, fazendo sua fezinha com os óculos na ponta do nariz? Pois é.

Só que quando reparei melhor, notei algo peculiar. O sujeito usava uma peruca. E não simplesmente uma peruca qualquer, era a peruca mais fake que eu já vi na face da Terra. As costuras todas aparentes mais ou menos na altura das têmporas, parecia um pequeno gorro feito de cabelo. É o tipo de peruca que não se compra quando se quer esconder a calvície. É o tipo de peruca que se compra por 20 mangos em qualquer loja de fantasias pra tirar uma onda só de farra.

Ele não parecia ser o tipo fanfarrão, embora estivesse no cabeleireiro de peruca. Mas a bem da verdade, é bom dizer que ele não estava lá cortando seus cabelos artificiais, e sim fazendo a barba. Barbeiro de bairro das antigas, lembra? Menos mal. Contudo, eu, sentado diretamente atrás do figura, tentava ler uma tradicional revista do ano passado, em vão. Meu olhar era atraído para aquela costura. Puro magnetismo que só o absurdo consegue causar. Tentava esconder um sorriso involuntário atrás das páginas.

O pior é que ainda tinha mais por vir. O barbeiro puxa papo com ele, o desgraçado responde qualquer bobagem e... ele é totalmente fanho! Tão fanho a ponto de ser incompreensível. Por um segundo cheguei a achar que ele estava falando outro idioma. Era a peruca mais fake da face da Terra. Na cabeça do cara mais fanho do universo conhecido. Havia uma certa harmonia poética nisso.

Não que eu tenha notado na hora. Naquele momento estava ocupado demais escondendo o rosto com a revista e tentando desesperadamente não cair na gargalhada. Parecia um tipo saído da ficção. Tinha cara e jeito de personagem, alívio cômico. Não faria feio, por exemplo, no meio da fauna exótica que habita as páginas virtuais de Capangas Contratados. Mas aí, se eu falasse que baseei numa pessoa real, todo mundo ia achar palha. Escritores são todos mentirosos profissionais, e por aí vai.

Mas esse daí existe. É o tipo de sujeito com o qual você tromba de vez em quando, quando menos se espera. É de carne e osso, mas você só acredita porque está vendo. De outra forma, só aceitaria que existe na imaginação fértil de alguém. Mas esses tipos existem. E vão cortar o cabelo de peruca.

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