No
post de hoje vou falar sobre o
Aquaman. E neste momento todo mundo deve estar se perguntando: por quê? Porque
eu gosto do personagem, simples assim. Sempre tive uma queda pelo chamado underdog (aquele cara pelo qual ninguém
dá nada). E Aquaman talvez seja o maior representante deles.
Ele
é um dos sete grandes medalhões da DC Comics, um de seus personagens mais
famosos (ao lado de Superman, Batman, Mulher-Maravilha, Flash, Lanterna Verde e
Caçador de Marte) e, no entanto, nunca fez nenhum sucesso comercial ou de
popularidade. Pior, sempre foi a piada da editora, muito graças a sua
participação no desenho dos Superamigos
que posteriormente rendeu uma série de vinhetas hilárias no Cartoon Network,
como aquela onde ele tenta se comunicar telepaticamente com uma pilha de atuns
enlatados num supermercado.
Suas
aventuras na era de ouro eram ridículas, para dizer o mínimo. Sim, ele
cavalgava um cavalo-marinho gigante. Mas qualquer HQs de super-herói do período
era igualmente imbecil ao ponto do dano cerebral. Graças a Deus eu fui criança
na década de 80, com a morte do Robin, o surgimento do Venom e por aí vai. Histórias
mais sérias, com mais desenvolvimento. Se fosse criança nas décadas de 40 a 60,
provavelmente jamais teria me tornado fã de quadrinhos.
Seu
primeiro título próprio durou bastante, mas sofria por ter sido publicado
justamente no período mais retardado das histórias de super-heróis.
Posteriormente ganhou algumas minisséries e mais uma tentativa de revista
mensal que não vingou. Só foi desfrutar de relativo sucesso com um novo título
publicado em 1994.
Na
época, a indústria estava desesperada com a vertiginosa queda de público. A
Marvel quase faliu. A DC resolveu chutar o pau da barraca e promover algumas
mudanças radicais com alguns de seus personagens mais famosos e/ou queridos.
Foi aí que o Superman morreu. Batman teve sua coluna quebrada. O Lanterna Verde
virou um vilão e foi substituído por um novato. O Arqueiro Verde morreu e seu
filho assumiu seu manto. Aquaman deixou barba e cabelo crescerem e perdeu a
camiseta laranja. Perdeu também uma mão, devorada por piranhas. Substituiu-a
por um arpão, adotando um visual mais “radical”. Coisa do período, a Image
Comics e heróis malvadões eram a tendência.
Ajudou
o fato da revista ser escrita por Peter David, operário-padrão da indústria,
sempre muito competente. Foi o título
mais longevo do herói. Ajudou também o fato de, na época, Grant Morrison estar
escrevendo a Liga da Justiça e ter resgatado os sete grandes como seus
protagonistas.
Mas
tanto David quanto Morrison saíram de seus respectivos títulos e ambos foram
sofrendo uma queda de qualidade. Mais uma vez, a revista do rei dos mares foi
cancelada.
Nos
anos seguintes, o personagem tornou a patinar. Tentaram uma abordagem mística.
Mas confundiram todo mundo, pois aquele Arthur Curry (seu nome real) não era o
verdadeiro Arthur Curry, só tinha o mesmo nome. Mas hein? Depois experimentaram
ligá-lo ao folclore do rei Arthur e até uma mão feita de água ele ganhou, para
substituir o arpão. Era possível contar nos dedos as boas histórias do
personagem (gostei bastante daquela do terremoto que afundou uma parte de San
Diego).
Eis
que a DC resolve dar um reboot em seu
universo. O novo título do Aquaman ficou com ninguém menos que Geoff Johns (o
Midas da editora, ou o Brian Michael Bendis da Distinta Concorrência) junto do
brasileiro Ivan Reis, sua principal dupla criativa, responsável pelo sucesso
recente do Lanterna Verde e pela saga A
Noite Mais Densa.
Era
tudo que o personagem precisava, os astros do momento tentando concretizar a
missão de finalmente levá-lo ao seu lugar de direito. Também seria sua última
chance. Se nem eles conseguissem, então estaria eternamente fadado ao fracasso
comercial e a ser sempre uma piada interna.
A
arte de Ivan Reis (um dos meus desenhistas favoritos atualmente) está
competente como sempre, mas o grande responsável por finalmente levar Aquaman a
um lugar de destaque (é um dos títulos mais vendidos dos chamados “Novos 52”) é
mesmo Johns. Ele fez isso de uma maneira ao mesmo tempo simples e genial:
abraçou a piada. Pegou tudo o que os leitores e a cultura pop têm de
preconceito com o personagem, e transportou direto para o universo do gibi. O
resultado atinge níveis de uma crueldade hilária.
Por
um lado você tem uma figura extremamente nobre (em todos os sentidos, o cara
faz parte da realeza!), que não pertence totalmente nem ao mundo da superfície,
nem ao submarino, mas ajuda ambos sempre que necessário. E que não é
compreendido por ninguém.
Um
cara que vira um carro-forte como se erguesse uma xícara de café e toma um tiro
de metralhadora na cara e a única consequência é um pequeno corte superficial.
E com tudo isso, ainda é tratado como a piada dos super-heróis. Policiais se
lamentam porque vão ser sacaneados por seus pares na delegacia por terem
precisado da ajuda do “meia-boca” Aquaman. Um deles lhe pergunta se ele precisa
de um copo d’água. E numa das cenas mais surreais dos últimos tempos, Arthur
vai almoçar num restaurante de frutos do mar, deixando os clientes do lugar
chocados.
Ao
mesmo tempo em que injeta grandes doses de ação e tenta expandir a mitologia do
personagem (parece que finalmente será revelado quem afundou a Atlântida),
Geoff incorpora todas as gozações e piadinhas de décadas no universo da
história e mostra como essa visão popular é equivocada, mas de um jeito tão
divertido e bem humorado que esse é o título mais prazeroso de se ler desde
o... Lanterna Verde. Coincidência?
O
escritor tem a coragem de dar a cara para bater ao assumir de vez a suposta
“tosquice” do personagem ao mostrá-lo, no começo de uma edição, despencando dos
céus no meio de um deserto. Claro que a piada do peixe fora d’água é feita, e
funciona. Nota-se que a trama está avançando para algum lugar e embora ainda
falte ao herói pelo menos um grande vilão (tudo bem, o Arraia Negra matou seu
filho, mas ainda assim não é uma figura memorável. Falta um Coringa, um Lex
Luthor), algumas possibilidades aventadas demonstram grande potencial para
serem desenvolvidas futuramente.
O
personagem amargou por mais de 60 anos (descontando-se, conforme já comentado,
alguns momentos) no limbo da mediocridade. Agora finalmente está sendo colocado
em seu patamar apropriado no panteão da editora de maneira surpreendente.
Demorou, mas finalmente encontrou seu lugar.
Não à toa, essa é a única revista que não aguentei esperar a publicação
por aqui e estou acompanhando simultaneamente com o lançamento nos EUA. Esse é
o título que tornou Aquaman grande, embora ainda seja divertido rir da cara
dele.
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